Resistência

Resistência

O que faz você ficar lendo este blog durante o expediente?

Ou pela enésima vez arrumar uma desculpa para não se exercitar?

Ou abandonar aquela idéia apaixonante há um mês atrás?

Enfim, levar aquela vidinha medíocre sem sobressaltos, sem riscos porém com um sentimento confortável de dever cumprido?

Resistência.

Ela aparece sob as mais diversas formas: numa fase inicial como medo ou preguiça porém numa fase mais avançada ela é bem mais insidiosa revelando-se como falta de tempo ou necessidade de mais estudo. Mas não se engane, o que ela quer é sempre uma coisa: fazer você ficar onde você está.

Ela não gosta de mudança e vai fazer de tudo para deixar tudo como está.

É uma força da natureza. Nasceu com você e vai ficar atuando até o último dia da sua vida.

Cabe a você saber disso e lidar com ela diariamente.

Nenhuma batalha ganha contra a Resistência faz você ficar mais forte ou faz ela ficar mais fraca. Isso porque quando você ganha uma batalha contra ela, os seus objetivos seguintes passam a ser maiores e ela sabe disso.

Ela não se cansa. Não tem de tomar Whey nem fazer ginástica.

O que fazer então?

Identificar que você está sob os efeitos Dela é o primeiro passo para mudar.

Existem dois grandes processos aos quais lidamos diariamente num processo de mudança: os processosrepetitivos e os processos criativos.

Os primeiros são aqueles que você conhece a receita (que é conhecida e repetitiva) porém tem de se dedicar durante um certo tempo para obter o resultado. Fazer ginástica, aprender Inglês, poupar para comprar um carro novo, enfim são aquelas tarefas que você sabe o que tem de fazer e a única coisa que você precisa ter é disciplina.

Nestes, a Resistência age fazendo você não ter paciência, querendo medir o resultado na primeira semana, subindo na balança no final de cada dia, você sabe como é. Todo mundo sabe.

O que nem todo mundo sabe é que, quando você está agindo assim, é a Resistência agindo e não você. Ela não quer que você emagreça aqueles três quilos nem muito menos que você aprenda a tocar guitarra. Nem pense em participar daquele Iron Man.

E a pessoa acha que está desistindo por livre e espontânea vontade. Pior, acha que é racional e que o resultado não deu certo porque ela está sem tempo, aquilo não é para ela. Ela nunca fez isso antes! E tem aquele carinha que já faz isso a tanto tempo e é muito melhor que ela.

Resistência. Resistência. Resistência.

Se ela tivesse uma cara, estaria rindo de você no momento em que você desistiu.

A pessoa que tem um pingo de conciência se frustra neste momento. Mas, como não está atenta a Ela, continua tocando a vida, com a Resistência lá só esperando para se manifestar na próxima ocasião.

Neste tipo de processo, de repetição, uma coisa que me ajuda é colocar uma meta factível com um prazo determinado (curto). Vou repetir: CURTO.

Isso é fundamental. Se você quiser começar a nadar e colocar como meta atravessar o Canal da Mancha, esquece. Não precisa nem dela para isso não dar certo. Aí você está sendo estúpido.

Vou nadar 500 metros três vezes por semana durante um mês. OK. Não pense. Não estabeleça nada além disso.

Não pense em aumentar para 700 metros depois de uma semana. Não foi isso o que você combinou.

Respeite a meta inicial.

RESPEITE A META INICIAL SEM PENSAR.

Sem pensar, sem dar tempo para a Resistência agir. Entre no seu carro, vá até o clube ou mar, troque de roupa, coloque os óculos de natação, caminhe até a piscina, entre na água e comece a dar as primeiras braçadas.

Depois das primeiras braçadas, você notará que a Resistência mudará a tática deixando de te convencer que você tem de trabalhar naquele projeto mais um pouco, que seus amigos estão a essa hora almoçando, que está chovendo (como se você não fosse se molhar mesmo), o trânsito vai estar uma porcaria, para tentar te derrubar nos primeiros metros salientando você está nadando os primeiros 50 metros e já está morto, muito cansado mesmo, imagina nadar 500 metros! E, perto do final ou mesmo depois de atingir a meta, que 500 metros não é nada, qualquer ser humano com dois braços e duas pernas nada 500 metros, que até alguémsem os dois braços ou as duas pernas nada 500 metros!

No dia seguinte, a mesma ladainha. E no dia seguinte, idem. Como eu te falei, ela não se cansa.

Lembra: não pensa, entra no carro, desce do carro, entra no vestiário, coloca a sunga, óculos, vai pra piscina, entra na piscina, começa a nadar. Só isso.

O lado bom é que depois do primeiro mês, neste restritíssimo escopo, você vai ter vencido a Resistência pois vai ver o resultado e, principalmente, a mudança já vai estar estabelecida.

Nos processos ditos criativos, ela é bem mais difícil de bater pois ela tem técnicas bem mais avançadas pra te deixar assim, desse jeito, sem inventar moda, sem tentar ser o Gandhi paulistano.

Porque?

Porque no processo criativo, você não tem certeza do resultado nem uma receita pronta. Você tem somente uma idéia apaixonante. Nada mais que isso.

E convenhamos que todo mundo já deve ter tido essa idéia. Essa idéia já foi tentada por muita gente, você não deve ter sido o primeiro.

Além disso, essa idéia vai atrapalhar a natação!

E olha que, pensando bem, ela não é tão boa assim.

Pronto.

Acabou.

Não precisou muito para ela acabar contigo.

E olha que, se a idéia passa desse ponto, você terá de estudar para poder fazer essa idéia funcionar. Isso, vai fazer um curso de 6 meses sobre o assunto.

Pronto.

Acabou de novo.

A Resistência se reinventa para poder acabar com todas as suas idéias.

E quando ela não consegue fazer isso no momento em que você está nos estágios iniciais, ela passa ao plano B: detonar o seu plano durante o processo de execução.

Exige conhecimento prévio, você não tem capacidade para fazer isso.

Será que você pensou em tudo mesmo? Olha o teu concorrente. Veja como o site dele é muito mais bem elaborado que o seu.

Olha quanta coisa aquele software pode fazer a mais do que o seu! Isso nunca vai dar certo se você não programar aquelas 376 funcionalidades que ele tem.

Viu como é fácil?

Pronto.

Mais uma vez, vencemos!

Que bom você ter abandonado aquela idéia. Ia perder tempo e dinheiro.

Vamos parar de besteira e voltar para a sua vida que essa é a vida que você sempre teve, que te deu prazer até agora. Não inventa moda.

Num processo criativo, existe um tempo para pirar, isto é, ter as idéias mais malucas a respeito de como resolver determinado problema ou como dar vazão aquele chamado interno.

Defina um prazo para ter algo concreto.

PRAZO E CONCRETO.

Isso é fundamental: não precisa ser o foguete que vai te levar à Lua. Basta ter um foguete que vai fazer subir até uma determinada altura e descer em segurança abrindo automaticamente o paraquedas. Isso vai estar pronto daqui a 60 dias.

Como daqui a 60 dias? Porque não 90 dias? ou 30 dias?

Pare um dia para definir as etapas para ter o foguete, nada muito detalhado (a Resistência vai querer que você pare os 60 dias para fazer um plano para ter um cronograma detalhado). Não.

Um dia é mais que suficiente. Ninguém tem todas as respostas nessa fase.

É comum você ter de improvisar durante o processo. Isso é um sinal que você está avançando.

Compre um calendário de papel, desses de pendurar na parede, com uma página para cada mês.

Defina os dias em que vai trabalhar no projeto. Lembra da natação.

Risque os dias em que você trabalhou no projeto. Isso vai te dar um empurrão no início.

Lembra que a Resistência estará lá no dia do lançamento para te lembrar que aquilo é totalmente sem sentido, que o foguete não faz nada de útil e que você só gastou tempo e dinheiro numa coisa inútil.

Mas aí você já sabe que ela é assim mesmo.

Que você vai ter de lidar com ela até morrer.

Bem vindo à guerra.

Bem vindo ao clube!

PS: Conheci o termo Resistência e todo o seu funcionamento a partir de um livro chamado The War of Art do Steven Pressfield. Se você está querendo ler um livro que pode mudar o jeito de você se enxergar, vale a pena lê-lo. É curto e direto ao ponto, como todo livro dele.